Venho de um pátio de crianças que brincam com a lua cheia e riem e correm e não querem ir dormir.

No pátio donde venho fica a tia Sara a contar estrelas e a sorrir.

Este lugar donde vimos ou ficamos é a recompensa de muito trabalho, de dias que correm menos bem, de pequenos confortos que deixamos aí.

Falo-vos do coração e exerço o meu direito à poesia: são momentos assim que fazem esquecer tudo e querer continuar, são as crianças que justificam tudo o que sonhamos fazer aqui, neste pátio do mundo, ou aí ou em qualquer outro lugar. E, rindo ou chorando com elas, não consigo já pensar noutra forma de viver.

África realmente altera-nos os sentidos, a percepção do mundo, a noção de céu e inferno, aquilo que julgávamos saber de nós.

Não sei porque falo no plural. Mas saiu assim e se calhar é porque nunca vivi com tanta gente diferente em tão pouco tempo, porque nunca senti como agora esta confusão de ser única e um grão de arroz, de ser diferente e tão igual, de sentir o cheiro das castanhas que não vou comer no vosso Inverno e salivar com as mangas que o calor de cá me oferece.

Pois é, nós por cá tudo bem, quando corre bem. Há dias de desânimo mas há sempre alguém que nos mostra que “há-de vir” e será muito bom quando vier.


Agora para mostrar realmente a minha veia poética um facto curioso: estou eu e um país inteiro à espera de chuva. Nada de mais, a não ser lembrar-me dum poema que escrevi para uma disciplina do meu curso o ano passado, sem nunca ter pensado em chegar aqui. Escolhi, de entre muitas, esta frase que me mandaram depois comentar:

Eu acho que a seca não seria nada se não fosse a falta de chuva.

                                                                                     (Fontanarosa)

E aqui fica, ao vivo e pela primeira vez na vida publicado, o que escrevi:

 

Branco mais branco, não há!

 

O exercício da constatação do óbvio

Pode não ser assim tão óbvio.

Mas, neste caso, parece-me óbvio:

A seca em que vivemos

Deve-se à falta de chuva,

A solidão em que habitamos

Deve-se à falta de humanidade,

O desamor que nos aniquila

Deve-se à falta de amor.

Tudo isto não seria nada

Se não nos fizesse falta.

A seca não seria nada

Se não provocasse a fome,

A fome não seria nada

Se não precisássemos de comer.

     And so on, and so on…

A vida, atrevo-me a dizer, não seria nada

Se não fosse obrigatório morrer…

E muito mais haveria a dizer sobre a agricultura!

 

Se calhar é um despropósito mas apetece-me mesmo agradecer aos companheiros ataca e lembrá-los do grande trabalho que estão a fazer, até porque aí longe, esta realidade que vivo todos os dias pode esbater-se…aqui não há forma de esquecer, por isso vos digo: estas crianças merecem tudo o que lhes conseguimos dar e mais, tanto que nem se consegue descrever. Estas e todas as outras, mas como estas são as que ajudamos…obrigada aí, malta!

Sabem que mais? Vou voltar ao pátio e contar estrelas também, que a sonhar todos temos direito!

Hoje não há parte sobre crianças em particular: apeteceu-me falar de todas!

Beijos e sonhem também.

Paula

3 Responses to Do lado de cá
  1. "…And then we sat on our own star and dreamed of the way that we were and the way that we wanted to be…Oh there was a sweet light, and the way…":)

    adorei o que escreveste…
    saudades**

  2. Olá minhas amigas! ESTOU COM MUITAS SAUDADES!!! QUERO VOLTAR!!!
    Como vou sobreviver sem a Casa Esperança?! Muitos beijinhos para as duas das sisters.

  3. Olá minhas amigas! ESTOU COM MUITAS SAUDADES!!! QUERO VOLTAR!!!
    Como vou sobreviver sem a Casa Esperança?! Muitos beijinhos para as duas das sisters.


[top]

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *