Queridos seguidores deste Blog,

A família e amigos têm-se queixado que não damos notícias suficientes mas comunicar daqui não é tao fácil como se imagina. Temos gostado muito do trabalho que temos feito. Se por vezes as pessoas se questionam se o trabalho que fazem faz sentido, se tem uma razão de ser para além do dinheiro ou se tem valor por si só, nós temos o privilégio de poder dizer que sim.

Mesmo em pequenas coisas, como em diálogo com as mamãs, nós sentimo-nos úteis, o que é muito gratificante:

Isabel: Então mamã, em que vai gastar este dinheiro?
Mamã: Quero comprar peixe congelado. – Isabel lê ficha da família e pergunta – “A mamã tem congelador para o negócio dos refrescos, não é?”
Mamã: Sim. Assim fica mais barato o peixe, custa só 450 meticais.
João: Mas quanto custa a mesma quantidade de peixe se comprar todos os dias?
Mamã: Não entendo.
João: Quanto tempo duram estes 450 meticais de peixe congelado – dá para um mês?
Mamã: Sim, um mês inteiro.
João: Se a mamã comprar peixe, sem ser congelado, para um mês quanto custa?
Mamã: 500 meticais.
Isabel: Mas tem de ligar o congelador para isso ou ele já está ligado para o seu negócio de refrescos? Está a vender refrescos agora no Inverno?
Mamã: Não vendo. Está desligado porque puxa muito.
João: Quanto paga de electricidade por mês se o tem ligado?
Mamã: 300.
Isabel: E se o tiver desligado?
Mamã: 100 meticais por mês.
João: Então mamã, assim não vale a pena comprar este peixe. – João explica contas à mamã. Esta diz que sim, mas não fica claro se entendeu. João levanta-se e explica outra vez a mostrar as contas.
Isabel: A mamã espera pelo Verão que é quando tem dentro do congelador os refrescos e aproveita para pôr o peixe também, até lá não vale a pena, só perde dinheiro. E se esvaziassemos com este dinheiro a sua latrina?

Seria redutor que se ficasse com a impressão que todas as mamãs que apoiamos têm estas dificuldades na gestão do seu dia-a-dia. Uma outra que visitámos, por exemplo, deixou-nos muito satisfeitos por a vermos tão empreendedora e focada em tornar-se independente. Com o dinheiro que a Ataca lhe deu investiu em arroz para venda. Ao ver que a procura do produto não era suficiente para gerar lucro, chegando mesmo a ter prejuízo, optou por comprar arroz em lata, pilá-lo e fazer bolinhos para vender. Comprou também, protegendo-se assim da eventual falha deste novo negócio, carvão para venda. Agora vai começar a comprar bananas para o seu “mata-bicho” (o pequeno-almoço) e dos seus filhos, que começavam todas as manhãs sem nada no estômago. Depois de conversarmos sobre como aplicar o novo dinheiro, decidiu comprar líquido para purificar a água que compra à vizinha – porque não tem canalização -, sabão para lavar as mãos antes das refeições e depois de usar a latrina, e desparazitante para toda a família, o que pode ajudar, porque a filha tem andado com muitas dores na barriga.

Antes só de terminar, não podíamos deixar de falar das nossa queridas amigas: a Rita e a Isabel, que terminaram a sua missão de voluntariado aqui em Moçambique. Antes de se despedirem organizaram um torneio de futebol, matemática e português para seleccionarem quem merecia receber as roupas que queriam doar, ao invés de as distribuirem sem critério.

São ambas verdadeiras «atacantes» da pobreza que tiveram um papel fundamental nestes seis meses em que cá estiveram. Foram óptimas companheiras deste dia-a-dia cá em Quelimane e ensinaram-nos muito. A elas um sincero obrigada por tudo que nos transmitiram!!A ver se mantemos o nível=).

Beijinhos e abraços a todos,
João e Francisca

One Response to Comunicar daqui não é tao fácil como se imagina
  1. João e Francisca,
    É de facto nas pequenas conversas, como as que relataram, que muitas vezes se faz a diferença, complementando o apoio financeiro prestado às nossas crianças e suas famílias.
    Estou certo que conseguirão manter o nível de qualidade e empenho durante a vossa Missão.

    Coragem.

    1 Abraço,
    Miguel Freitas


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