Aqui, na terra, onde planear o futuro é uma incógnita vive-se o dia-a-dia conforme o sabor do tempo. Por isso, o não trabalhar, o não estudar, o não ter dinheiro para comida, o só fazer uma refeição por dia e, num caso extremo, nunca fazer uma refeição por dia, é vulgar para estas pessoas.
Engraçado é que o “europeu” chega, e ouve as mamãs a dizer que vão na machamba e que é a única forma de subsistência e caso, a natureza, lhes pregue uma partida, não têm alternativa para conseguir comer. O que faz o “europeu”? Na maioria dos casos e, de forma involuntária, (espero eu, que assim seja) tem um discurso “fácil” para as mamãs: “a mamã sabe que deve iniciar um novo negócio; a mamã não pode continuar assim…”, se a criança não vai à escola: “porque é importante ir à escola” – e eu pergunto: Porque é que as pessoas se comportam assim? Serão assim, porque é da natureza delas e não haverá nada a fazer por elas? As pessoas nasceram traçadas para sofrer ou para serem felizes? Será que nasceram, sem o direito de dignidade e respeito?
Pois, para mim, toda a gente nasce com direitos iguais mas, não escolhe onde nasce nem as circunstâncias em que nasce! O problema é estrutural, que acaba por conduzir a um ciclo vicioso… a um Ciclo de Pobreza! Se é certo que a pobreza sempre existiu e sempre vai existir, não devemos ter a utopia de que, com o nosso trabalho, iremos extingui-la; mas podemos procurar caminhos modestos para introduzir mudanças neste ciclo.
Para esta mudança, é essencial ouvirmos a pessoa envolvida, o que acha da situação em que se encontra; dar voz para que a pessoa consiga exprimir o que acha que deveria ser feito. No entanto, a mudança de comportamentos não é fácil e, para tal, é necessário experimentar pois, só sabemos se determinada situação é benéfica quando temos a experiência dessa vivência.
A este respeito, partilho convosco o caso de uma família que a ataca apoia: este agregado é composto por três crianças e três adultos. Um dos elementos é uma jovem rapariga de 23 anos que não estuda, nem faz negócio – passa os dias todos em casa.
Na primeira visita que realizei, esta jovem recusava-se a falar comigo, recusava que a pesássemos e a medíssemos. Logo, percebi que alguma coisa se passava, pois a sua cunhada (irmã do seu companheiro) começou a dizer-me que não se falavam porque essa rapariga se negava a tomar conta das crianças aquando da sua ausência, que apesar de viverem na mesma casa, parecia que viviam em casas separadas.
Falei com cada pessoa individualmente e depois reuni todos, para tentarmos perceber, em conjunto, o que seria melhor para todas as pessoas, naquela casa – argumentando a importância de serem uma família e de se entenderem como tal, a importância de um relacionamento saudável para o bem-estar das crianças. Procurei sensibilizar a jovem para a importância de estudar e também de iniciar um negócio – para ter o seu tempo ocupado, ganhar novas competências, estar em contacto com outras pessoas, relacionar-se com os outros – em vez de estar sempre isolada em casa.
Passado umas semanas passei por lá, a ver como estavam as coisas e disseram-me que a relação entre eles estava a melhorar, que já se começavam a falar; no entanto começar a ir à escola e iniciar negócio, ainda não tinha sido trabalhado.
Ontem, voltei lá e fique maravilhada quando a jovem me disse que já tinha iniciado negócio de bolinhos e vai vendê-los para uma escola, que fica perto de casa – disse, que para já ainda está no inicio, que é para ver como corre, mas que vai continuar a tentar.
Na minha opinião, este exemplo, demonstra que é possível introduzir pequenas mudanças, num ciclo que se torna vicioso. É certo, que não será uma mudança impetuosa, mas devemos dar o tempo que as pessoas precisam para amadurecer determinadas ideias – pois, a mudança oferece sempre resistência!
Beijinhos e abraços,
Até breve!
Rita Castro Meneses
Olà Rifa, obrigado pelo teu relato, simples, conciso, mas com muito conteúdo!
Continuação de boa Missão,
Miguel Freitas
Maravilhoso!!!
É, é assim, tantas vezes, na nossa própria vida… na vida dos "europeus":)
Força!!!
Ângela
Rita, nossa tão querida voluntária 🙂
Sempre soubemos que a tua passagem por Moçambique seria muito importante – é grande a sabedoria de uma jovem que tem a noção de que se deve colocar no lugar do outro… de que é importante dar espaço para o amadurecimento de uma ideia, …
Nem parece que só tens 24/25 anos (se a memória não nos atraiçoa!).
Demonstras mais amadurecimento e entrega do que muitas pessoas da nossa idade!!!
Bem hajas! Gostamos muito de ti.
Temos a certeza que, com esse comportamento, deixarás muitas pequenas (grandes) marcas em Moçambique, porque embora só possas medir o impacto imediato, a verdade é que a jovem que foi motivada para começar o negócio, acabará por motivar as pessoas que lhe são próximas e o valor acrescentado que parece só tocar uma pessoa, pode vir a repercutir-se noutras pessoas e, provavelmente, mais depressa do que se possa julgar. Haverá uma exponenciação em cadeia de um gesto que te pareceu só ter resultado numa pequena mudança 🙂
Tudo de bom!
Um grande xi para ti e para os nossos tão queridos voluntários, Melo e Evaristo,crianças da CE e Irmã Idalina das saudosas
Sisters